quinta-feira, 19 de novembro de 2009

LA FILLE DU RÉGIMENT - Royal Opera House, Londres, Janeiro de 2007

La fille du régiment (A filha do regimento), de Gaetano Donizetti, é uma ópera cómica que, apesar de conter diversas árias líricas e duetos, não está incluída entre as obras do bel canto que mais gosto. Devo confessar, desde já, que sou um grande apreciador do estilo. O enredo é banal: Uma orfã, Marie, é criada num regimento de soldados e apaixona-se por um jovem tirolês, Tonio. Surge a Marquesa de Berkenfeld, sua tia, que informa o Sargento Sulpice que quer levar Marie para o seu castelo para lhe ensinar boas maneiras, afastando-a de Tonio. No castelo, a Marquesa tenta ensinar Marie a cantar e a comportar-se, para que se case com um homem rico. Sulpice aparece, pede à Marquesa que deixe Marie casar com Tonio, mas esta recusa. Tonio exprime o seu amor por Marie, a Marquesa afinal é mãe e não tia e acaba por permitir o casamento com Tonio. Tudo acaba em felicidade, com um fervoroso hino de suadação à França.
A ópera contém uma das mais famosas arias para tenor - "Pour mon ame" - com nove dós de peito e tem várias outras de grande beleza lírica como, por exemplo, "Ecoutez-moi, de grâce!". Contudo, se o tenor deverá ter qualidades excepcionais, o mesmo se exige à interprete de Marie, um soprano lírico de grande capacidade técnica, dado que a ela estão cometidas muitas árias e duetos tão difíceis quanto belos. É, naturalmente, a figura principal da ópera.

A produção da Royal Opera House de Londres, encenada por Laurent Pelly e dirigida por Bruno Campanella, resultou num espectáculo que não mais esquecerei e, cada dia que passa, mais me convenço que assisti a uma verdadeira obra de arte, seguramente um dos melhores espectáculos de ópera que vivi em toda a minha vida (e já conto muitas dezenas). É impressionante como, de uma ópera trivial, se consegue fazer uma obra prima.
Juan Diego Flórez foi Tonio. No auge da sua forma, foi vocalmente insuperável, com a sua voz redonda, timbre lindíssimo, legato irrepreensível e, nos agudos, humanamente impossível. Juntou-se uma boa presença em palco (embora, por vezes, um pouco estática), ajudada pela figura de homem jovem, bem parecido, totalmente ajustado à personagem.
Alessandro Corbelli foi um Sulpice convincente, boa presença em palco, voz potente e de bem timbrada.
A Marquesa de Berkenfeld foi interpretada por Felicity Palmer, outra excelente actriz com uma boa voz, madura, perfeitamente adaptada ao papel.
Natalie Dessay foi uma Marie inexcedível. Excepcional actriz, simpatia transbordante, voz de cortar a respiração, bonita, potente, capaz de percorrer toda a escala sem sombra de vibrato, coloratura irrepreensível e cantando igualmente de pé, sentada, deitada, ou de cabeça para baixo. Um espanto!
Finalmente uma palavra de apreço para o público. Deixou ouvir tudo até ao fim, sem interromper extemporaneamente com aplausos que, quando surgiram, quase deitaram a casa abaixo.

Esta produção de La fille du régiment continua a ser apresentada regularmente em diversos teatros de ópera (entre eles Londres, Nova Iorque, Viena, Barcelona). Recomendo-a vivamente, pois é um espectáculo inesquecível. Também existe em DVD mas, apesar das potencialidades que estes nos proporcionam, assistir ao vivo é uma experiência sem paralelo.

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