segunda-feira, 23 de março de 2015

DON GIOVANNI , Teatro Thalia, Lisboa, 07/03/2015

  


Texto de José António Miranda

DON GIOVANNI (Wolfgang Amadeus Mozart), ópera em dois Actos, libreto de Lorenzo Da Ponte.
Direcção musical: Pedro Amaral
Direcção cénica: Jorge Vaz de Carvalho
Roupas: José António Tenente

Don Giovanni: Jorge Martins
Leporello: José Corvelo
Donna Anna: Alexandra Bernardo
Donna Elvira: Catarina Archer
Don Octavio: Carlos Monteiro
Zerlina: Camila Mandillo
Masetto/Il Commendatore: André Henriques

Orquestra Metropolitana de Lisboa
Coro Lisboa Cantat     Dir: Jorge Carvalho Alves
Cravo: Joana Barata

Produção: Ateliê de Ópera da Metropolitana

Uma surpreendente proeza esta, a de conseguir apresentar a ópera de Mozart numa auto-denominada "versão semi-cénica" sem cair na palhaçada de mau gosto em que frequentemente estas apresentações híbridas se transformam.
Pelo contrário, o que vimos no espaço cenográfico do Teatro Thalia (porque em rigor do seu palco à italiana o que resta é o espaço) foi um belíssimo espectáculo que poderia sem problema ser apresentado em qualquer um dos nossos teatros líricos sem envergonhar os seus autores. O mérito é antes de mais de Vaz de Carvalho.




A ausência de cenários, de adereços e de maquinaria cénica ou de trabalho da luz, a orquestra ocupando a quase totalidade da zona central do espaço cénico deixando apenas para os cantores uma estreita faixa junto do proscénio, todos estes factores não transformaram o espectáculo numa versão de concerto de uma ópera.

Graças ao cuidadoso trabalho de actores, através da inteligente utilização dos únicos recursos disponíveis (vocais, corporais e espaciais) antes assistimos àquilo que poderemos denominar como uma ópera apresentada numa opção cénica minimalista, teatro lírico sem dúvida.

A qualidade global do espectáculo foi claramente superior à de apresentações do mesmo tipo recentemente vistas no São Carlos ou no auditório da Fundação Gulbenkian, e isso é também verdade mesmo quando as analisamos sob o ponto de vista estritamente técnico vocal.

Os solistas em cena, na sua maioria participantes no denominado Ateliê de Ópera da Metropolitana (infelizmente por aquelas bandas não se conhece a tradução portuguesa do francês atelier), foram profissionais esforçados até ao limite das suas capacidades e demonstraram em geral um considerável domínio técnico dos seus instrumentos vocais.

Devo realçar em particular a magnífica actuação vocal de Alexandra Bernardo (Donna Anna) e o perfeito desempenho global de José Corvelo (Leporello).

À uniformidade qualitativa dos solistas e coro, também ele muito bem, correspondeu no entanto um desempenho de menor qualidade por parte da orquestra. Provavelmente o facto de ter à sua frente todo o espectáculo terá contribuído para uma menor concentração dos músicos, e a sonoridade global terá sido por isso prejudicada sobretudo a nível da expressividade dinâmica.

Por outro lado, a posição do maestro, com os cantores fora do seu campo de visão na maior parte do tempo, poderá parcialmente explicar alguns desacertos momentâneos, ou mesmo a opção por um tempo algo arrastado que foi patente nalguns momentos.

No entanto, e apesar do cansaço visível em todos como resultante de o início do espectáculo ter sido erradamente programado para uma hora tardia, a minha sensação ao sair da sala na madrugada de domingo era a de ter mais uma vez tido a oportunidade de verificar que, apesar das malfeitorias a que nos últimos tempos tem sistematicamente sido submetida, a cena operática doméstica está viva e plena de valores que importa acarinhar.

Sem esse cuidado, que depende muito menos do que parece dos recursos materiais, mas sobretudo de muito mais inteligência do que a que vemos em acção, teremos inevitavelmente a repetição do tradicional cenário de fuga para o estrangeiro para os novos valores que despontam.

E como resultado óbvio de tal fatalidade, a persistência doméstica de um público envelhecido e satisfeito no seu provincianismo, que não consegue renovar-se senão marginalmente.
E de facto, como se compreende senão por grosseira falta de visão, que este espectáculo tenha sido programado para o mesmo dia e hora em que, no Teatro São Luiz era apresentado o excelente trabalho do Estúdio de Ópera da Escola Superior de Música de Lisboa. Haja deus!

José António Miranda    09/03/2015

2 comentários:

  1. Realmente, repara bem que a renovação no nosso público é duvidosa. Entretanto, tudo se aplaude de pé. Não soube de nada e não vi o Don Giovanni. Pode enviar ou fazer upload de fotografias do teatro por dentro para ver como ficou? Agradecido placidozacarias@gmail.com

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    1. Enganei-me. O email seria placidozacarias.operalisboa@hotmail.com

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