terça-feira, 1 de maio de 2018

ANDREA CHÉNIER, Viena Staatsoper, Abril / April 2018




(review in English below)

A opera Andrea Chénier de Umberto Giordano esteve em cena na Ópera Estatal de Viena, tendo como atractivo principal a participação de Jonas Kaufmann como protagonista. Os bilhetes esgotaram num ápice quando a bilheteira abriu online e, no mercado negro, atingiam preços proibitivos.

A Ópera de Viena informa (verbalmente e em cartazes) que não se responsabiliza pela venda dos bilhetes que é feita por dezenas de indivíduos de países de leste, mascarados de Mozart, que o fazem á volta de todo o teatro. Se paramos para olhar para um cartaz, esteja ele onde estiver à volta do teatro, somos imediatamente abordados. Não percebo como isto é permitido, mas é sempre assim.



Depois desta primeira nota negativa, uma muito positiva. Numa das laterias do teatro está instalado um écran gigante que transmite em directo muitas das óperas em cena (foi o caso desta) permitindo a quem não conseguiu comprar bilhetes poder ter uma ideia do que se passa na sala.




A Anja Harteros, durante os aplausos, confrontada com a filmagem mesmo atrás da cortina, puxou operador de câmera para o palco, num momento hilariante.



A velha encenação de Otto Schenk é muito clássica, kitsch, desinteressante. A Orquestra da òpera de Viena foi bem dirigida pelo maestro Marco Armiliato  que, contudo, não se preocupou excessivamente com os cantores.



Quanto aos solistas, alguma heterogeneidade. O barítono Roberto Frontali fez um Carlo Gérard de grande qualidade. A interpretação cénica foi convincente e a voz é cheia, afinada e sempre bem projectada.


O Roucher do barítono Orhan Yildiz cumpriu sem deslumbrar.

Das interpretações femininas a Bresi da soprano Ilseyar Khayrullova de voz muito agradável e suave foi interessante e correcta, a Condessa de Coigny da mezzo Donna Ellen foi algo agreste e a Madelon da mezzo Zoryana Kushpler foi óptima, com uma voz grave imponente e excelente presença cénica.

Verdadeiramente sensacional e, de longe, a melhor da noite foi a soprano Anja Harteros como Maddalena di Coigny. É uma cantora de que muito gosto e hoje foi, talvez, uma das melhores interpretações que lhe ouvi. A voz é de uma beleza única e no registo mais agudo é impressionante na qualidade, suavidade e segurança. Na belíssima ária La mamma morta quase chegou ao nível divinal da Callas, a minha referencia neste trecho. Absolutamente fantástica.




Deixo para o fim o tenor Jonas Kaufmann que, como sabem os leitores regulares deste blogue, é um dos meus cantores favoritos e era a grande estrela da noite. Foi uma decepção. Tem uma voz de timbre único, grave mas com agudos fabulosos e esta característica é intrínseca e manteve-se. Mas fez um Andrea Chénier sem alma, com pouca entrega na interpretação e vocalmente deixou-se afogar pela orquestra com frequência. Foi uma pena, mas admito que também os cantores tenham dias menos bons e este foi, seguramente, um deles. Ainda assim tinha umas dezenas de pessoas à sua espera na stage door, muitas delas com flores e outros presentes mas, para decepção de todos e após mais de 1,5 horas de espera, chegou a informação de que foi o único que saiu por outra porta. Ele lá saberá porquê...



Um espectáculo aquém das minhas elevadas expectativas.








****


ANDREA CHÉNIER, Vienna Staatsoper, April 2018

Umberto Giordano’s opera Andrea Chénier was on stage at the Vienna State Opera, with the main attraction being the participation of Jonas Kaufmann as the protagonist. Tickets sold out at a glance when the box office opened online and on the black market hit prohibitive prices.

The Vienna State Opera reports (verbally and on posters) that it is not responsible for the sale of the tickets which is made by dozens of Eastern European ndividuals masked as Mozart from around the theater. If we stop to look at a poster, wherever it is around the theater, we are immediately approached. I do not understand how this is allowed, but it is always like this.

After this first negative note, a very positive one. On one side of the theater is installed a giant screen that transmits live many of the operas on the scene (it was the case of this one) allowing those who could not buy tickets to get an idea of ​​what is going on in the room.

Anja Harteros, during the applause, confronted with filming right behind the curtain, pulled the camera operator to the stage in a hilarious moment.

Otto Schenk's old staging is classic, kitsch, uninteresting. The Orchestra of the Vienna State Opera was well directed by maestro Marco Armiliato, who, however, did not care too much about the singers.

As for the soloists, some heterogeneity. Baritone Roberto Frontali was a Carlo Gérard of great quality. The stage interpretation was convincing and the voice is full, tuned and always well-projected.

Baritone Orhan Yildiz did not dazzle as Roucher.

From the female interpretations, Bresi of soprano Ilseyar Khayrullova sang with a very pleasant, correct and smooth voice, the Countess of Coigny by mezzo Donna Ellen was somewhat harsh and Madelon from mezzo Zoryana Kushpler was excellent, with an imposing low registation and excellent stage presence.

Truly sensational and by far the best of the evening was soprano Anja Harteros as Maddalena di Coigny. She is a singer I really like and today was perhaps one of the best interpretations I heard. The voice is of a unique beauty and in the highest register she is impressive in quality, softness. In the beautiful aria La mamma morta she almost reached the divine level of Callas, my reference in this area Absolutely fantastic.

I leave to the end tenor Jonas Kaufmann who, as the regular readers of this blog know, is one of my favorite singers and was the great star of the night. He was disappointing. He has a unique voice, with a strong low register but with fabulous top notes and this characteristic is intrinsic and maintained. But he interpreted a soulless and underpower Andrea Chénier vocally drowned by the orchestra often. It was a pity, but I admit that the singers also have less good days and this was, without a doubt, one of them. Yet there were dozens of people waiting for him on the stage door, many of them with flowers and other gifts, but to everyone's disappointment and after more than 1.5 hours of waiting, the information came that he was the only one who left by another door. He will know why...

****

2 comentários:

  1. A récita do Chénier de 26.4 foi fantástica. Ao contrário da sua récita, o Kaufmann esteve muito bem: não tem o brilho do Pavarotti ou do Domingo neste papel, mas teve uns agudos kauffmannianos impecáveis, ouviu-se sempre e esteve lá. Acho que teve azar! A Harteros também foi óptima, mas muito longe da Callas que continua imbatível neste papel. E dá-me ideia que a Netrebko está um bocadinho acima da Harteros, pelo menos na intensidade dramática que consegue. Mas gostei muito, muito dela: voz cristalina, grande e elegante. Quem me surpreendeu foi o Frontali que foi um Gérard fantástico!

    O Armiliato também excelente, embora por vezes se estique um pouco e não observe os cantores como podia. Fez o mesmo na Butterfly de Madrid que vi na temporada passada com a Jaho/León/Odena. Mas, tirando isso, perfeito!

    A encenação é que é das maiores porcarias que o Otto Schenk fez: devia detestar a ópera. Tornou-a insonsa e dá-lhe aquele final ridículo com os amantes abraçados na carroça. Nem parecia que iam para a guilhotina. Se acabasse com uma cena de cama era mais coerente com o que parecia passar-se. Merecia um booooo!

    O Kaufmann também não deve ter ficado para autógrafos neste dia. Em menos de 30 min estava com o Armiliato na mesa ao lado da minha num restaurante italiano ali ao lado...

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Sorte a sua em ter ouvido o Kaufmann como sempre esperamos. Comigo, apesar das minas elevadas expectativas, não aconteceu. E se o apanhasse na mesa ao lado da minha de um restaurante, não deixaria de lhe dizer que teria esperado melhor! (admito que, consigo, não foi o caso).

      Eliminar